Novo ano, nova mota, a mesma vontade de vencer
Pablo Quintanilla sabe bem uma coisa: ninguém regressa igual do Dakar.
Desde a sua estreia em 2013, quando a corrida teve lugar no seu amado Chile, bem como na Argentina, Bolívia e Peru, ele passou por tudo. Sucessos e fracassos, grandes realizações humanas e uma dor física inacreditável.
A edição de 2024 será a 12ª participação de Pablo na competição off-road mais difícil do planeta. Novo ano, nova mota, a mesma vontade de vencer. Pablo fez um sólido Dakar de 2023, terminando mesmo à beira do pódio em P4, e foi o melhor classificado da Monster Energy Honda Rally Team, mas não era o resultado que tinha em mente. Está na altura de tentar outra vez.
"O DAKAR É ASSIM: MUITOS ALTOS E BAIXOS, COM TANTOS FACTORES QUE NÃO PODEMOS CONTROLAR, COMO A CHUVA, O CANCELAMENTO DA ETAPA... FAZEMOS PLANOS, MAS DEPOIS TEMOS DE SER RÁPIDOS PARA NOS ADAPTARMOS AO INESPERADO".
Como é que vê o percurso de 2024?
"David Castera, o Diretor do Rali Dakar, antecipou que esta seria a edição mais difícil desde que competimos na Arábia Saudita. A introdução do cronómetro de 48 horas traz um tempero extra. Fica bem no papel e será uma novidade para todos".
No ano passado, competiu pela vitória durante todo o rali. Olhando para trás, há algo que poderia ter feito de forma diferente?
"O Dakar é assim: muitos altos e baixos, com tantos factores que não podemos controlar, como a chuva, o cancelamento de etapas... fazemos planos, mas depois temos de ser rápidos para nos adaptarmos ao inesperado".
Novo ano, nova mota, como é a nova Honda CRF450 Rally?
"É um grande passo em frente. É mais leve e mais rápida, mais suave e mais fácil de conduzir. Tenho muito mais confiança na condução e isso dá-me velocidade e mais clareza para tomar boas decisões".
Dois títulos do Campeonato do Mundo FIM, vice-campeão do Rali Dakar em 2020 e 2022 e terceiro lugar em 2016. Foste o melhor Monster Energy Honda a terminar o ano passado, o que te mantém motivado?
"O Rali Dakar é mais do que uma corrida, é um modo de vida. É um fogo interior: queremos ir mais longe, queremos ir mais longe, mais depressa. Se alguém quer correr o Dakar, tem de o fazer com 100% de empenho e ter a certeza absoluta, porque vai fazer-nos sair da nossa zona de conforto a cada km. Gosto desta sensação de ter de agir em tantas situações imprevisíveis, de ter de provar a mim próprio que sou capaz de atingir os meus objectivos".
Como é que se pode andar a quase 150 km/h e continuar a ler o roadbook?
"É algo que eu também me pergunto! O ritmo das corridas é mais rápido todos os anos: as motos estão a evoluir para as motos de Motocross porque as etapas são planas, mas não se pode saltar com uma moto de MX e ler um roadbook.
"É preciso treinar durante um ano inteiro para abrir o acelerador e ler as notas, mas também para desenvolver uma mente rápida para absorver a informação, ler o deserto e tomar as decisões correctas".
Tem tempo para apreciar a paisagem?
"Sim, e o deserto na Arábia Saudita é fantástico, passamos por sítios que parecem de outro planeta".
O Dakar tira-nos da nossa zona de conforto, certo? A começar pelo despertador do relógio a meio da noite...
"É preciso ter a mentalidade de um guerreiro para enfrentar as longas ligações frias quando ainda está escuro. As primeiras bicicletas arrancam por volta das 4:00 da manhã, por vezes até às 3:30. Nos primeiros dias, a motivação ainda é muito elevada, mas na segunda semana parece que dormimos apenas 15 minutos. É duro".
Qual é a sua rotina diária para se centrar e incorporar a mentalidade de guerreiro?
"Preparo tudo na noite anterior: a mesma ordem, o mesmo sítio. De manhã, visto-me seguindo a mesma sequência: primeiro as meias, depois os protectores de joelhos, as calças, o casaco... Bebo um copo de água para ativar o corpo, café, pequeno-almoço e depois ponho música. No Dakar, ouço música eletrónica e melódica que me ajuda a estar centrado, a ligar o meu coração aos meus objectivos. Bateria, vozes melódicas que brincam com as emoções".
O teu primeiro pensamento quando saltas para a moto.
"É algo de que se está realmente à espera! Subo para a mota com a confiança de que fiz todo o trabalho: agora é altura de juntar tudo e desfrutar da viagem!"
Quão difícil é manter-se sempre no topo?
"Para ter êxito, é preciso falhar muitas vezes. O sucesso é uma percentagem baixa da nossa carreira, mas os momentos difíceis tiram o melhor de nós, ensinam-nos a ter coragem e a evoluir. Há cinco anos, no Peru, quando estava a lutar pela vitória, lesionei-me de tal forma nos tornozelos que ainda sofro com isso. Houve um momento em que pensei que talvez a minha carreira tivesse acabado, mas nunca desisti. Tive de treinar esta fraqueza, de adaptar o meu estilo de pilotagem. Algo mudou dentro de mim e regressei mais forte e, desde então, tive dois segundos lugares e estou aqui para outra oportunidade, a lutar pela vitória totalmente motivado".
De que é que sentes mais falta quando estás no Dakar?
"Dos dias de sol na praia com a minha família e amigos, porque nesta altura do ano é verão no Chile".
Qual é o seu principal ponto forte?
"A minha experiência e também a minha mentalidade. Sinto que sou capaz de tomar decisões estratégicas sob stress e de fazer a mudança quando é preciso fazer o máximo".
O que tem de especial a equipa Monster Energy Honda?
"As relações entre os pilotos e os membros da equipa tornam esta equipa única: temos muito respeito uns pelos outros, reconhecemos os pontos fortes de cada um, passamos muito tempo juntos dentro e fora das corridas".
Trabalhador, confiante e apaixonado pela vida. De onde vem isso na tua família?
"Respeito muito o meu pai Arturo. Ele é um trabalhador esforçado. Começou do nada e construiu algo grande e importante. É uma pessoa simples e gosto de passar tempo com ele, adora a sua família e admiro-o muito".
Por fim, ninguém regressa igual de um rali Dakar; parte-se como um rapaz e regressa-se como um homem.
"É verdade. Aprendi muito como piloto e como pessoa. Compreendemos que temos de trabalhar arduamente se queremos algo na nossa vida, temos de ser fiéis a nós próprios. Seguir os nossos sonhos e, se algo correr mal, não dura para sempre. É preciso confiar nos outros, porque não se consegue tudo sozinho, acreditar nos nossos objectivos e desfrutar do processo".